terça-feira, 4 de setembro de 2012

Os marxistas, as bases do PT e o "mensalão"

Nada como uma boa análise marxista pra se compreender a política. Desde "O 18 Brumário". O problema dos marxistas brasileiros (e de outras partes?) é quando (e isso é muito comum, infelizmente), em vez de usar o marxismo para a analisar a realidade, ficam presos a análises prontas e tentam encaixar a realidade nelas. Aí, dá análises simplistas, repetitivas, enfadonhas, que dão sono e levam seus autores ao ridículo, pois falam com pompa, considerando-se os reis da cocada preta, mas ninguém os leva a sério. Que outra explicação há para o fato de um dirigente sindical operário de pouco conhecimento, mas atento à realidade e carismático, ter se tornado o líder do Partido dos Trabalhadores brasileiro, sem que intelectuais marxistas lhe façam sombra?
Mas eles continuam falando, nem notam que a plateia está só diminuindo, ou notam, mas justificam que é a alienação do povo, a conjuntura etc. e tal. Pior é que as análises são longas, muito longas. Quando, no entanto, o método é usado para analisar a realidade, o resultado é insuperável, como se lê no texto abaixo (o qual tem ainda uma fraqueza: não considerar a importância histórica da força mítica e simbólica do ex-presidente Lula).
Como numa história de detetive, a questão principal da farsa do "mensalão" é: por que o PT compraria parlamentares reacionários para votar políticas reacionárias, que eles aprovariam sem receber para isso? Nenhum projeto transformador da sociedade foi aprovado pelo Congresso para justificar a tese do "mensalão", que não foi confirmada nas investigações, mas o "juiz" relator do STF pediu a condenação dos réus mesmo assim. O mesmo STF que absolveu o ex-presidente Collor e engavetou o julgamento do "mensalão tucano", origem e anterior ao petista...
Trata-se de um julgamento político, com o qual, por incrível que pareça, o próprio PT é conivente, pois aceitou jogar de acordo com as regras do jogo e estas dizem que o STF é imparcial. O STF é tão imparcial quanto um juiz da CBF (e da Globo) que apita uma final entre Flamengo ou Corinthians e um time "pequeno", de um estado "menor".
O que está em curso não é o julgamento de petistas, mas um golpe mortal no PT, o único partido fundado por trabalhadores na história deste País. Se dirigentes petistas cometeram crimes, foram crimes que os dirigentes de outros partidos já cometeram e continuam cometendo. A revista Veja foi o principal instrumento de denúncia do "mensalão". A mesma revista que, agora se sabe, faz parte do crime organizado do Cachoeira. Mas a revista não está sendo investigada. Por quê?
Os resultados da campanha para destruir o Partido dos Trabalhadores se fizeram sentir em manifestações de eleitores petistas e lulistas que repetem o que ouvem e veem na "grande" imprensa. São os "desiludidos" e "traídos". Eles acham que o PT precisa tomar uma lição para aprender, que "o PT é igual aos outros". Em 2006 e 2010, os efeitos foram revertidos, mas agora que Lula está fora do poder, parece que o julgamento no STF tem maior repercussão.

Da Esquerda Marxista -- seção brasileira da Corrente Marxista Internacional.
O julgamento do "mensalão" e o ódio de classe da burguesia
Wanderci Bueno
A maioria dos dirigentes do PT, por meio da política de colaboração de classes com a burguesia, há muitos anos tem levado o partido à destruição. O "mensalão" e agora seu julgamento pelo STF demonstram o quão equivocada é a política de unir-se aos inimigos da classe trabalhadora.
O PT, fundado em 1980, é fruto das grandes mobilizações operárias e de massas contra a ditadura militar, contra os partidos da burguesia e pela construção do socialismo. Em sua origem, o PT foi um partido de massas com fortes traços de independência de classes, mas, desde o início, esteve sob pressão para ser um partido de toda a sociedade e não um partido de classe, operário e sem patrões. Essas pressões do capitalismo e das instituições de seu Estado sobre a direção do partido encontraram eco nas ideias dos herdeiros das concepções reformistas e stalinistas. Com a diminuição do grau de radicalidade das lutas operárias, estes dirigentes foram se sentindo à vontade para aplicá-las mais e mais como uma política que, por não confiar na capacidade revolucionária e transformadora das massas, foi seguidamente aniquilando o programa e manifesto de origem do partido.
O "mensalão" é uma farsa e uma fraude contra o PT
A eleição de Lula em 2002 se deu sob a égide dos compromissos a serem honrados com os capitalistas, o que foi expresso na Carta aos Brasileiros. O centro da atividade do partido era garantir uma base de sustentabilidade, de governabilidade, a Lula. Mas a burguesia temia e teme as massas, por isso não confia no PT e em seus candidatos, mesmo que em aliança de classes.
O financiamento das campanhas eleitorais do PT realizado com contribuições da burguesia ocorre porque foi perdida a conexão com a independência de classe. Adotada a colaboração, os métodos de sustentação financeira do partido passam a se dar em harmonia com essa linha política. O uso do método burguês de caixa dois financiada por capitalistas é o fruto podre da colaboração de classes.
Para a burguesia, desde sempre, a prática de caixa dois é uma coisa normal. A burguesia empurrou cada vez mais e mais dirigentes do partido para agirem como ela mesma sempre agiu. A burguesia faz o que faz e fica impune porque tem a seu lado as instituições do Estado e a grande imprensa.
Entretanto, o "mensalão", a acusação de que o PT pagava parlamentares para que estes votassem a favor do governo, é uma farsa do começo ao fim. A corrupção enraizada no Congresso Nacional é feita de outra forma, através de leis, emendas liberadas, dos lobbies empresariais, isenções, desonerações, privatizações etc. Os projetos dos governos do PT em aliança com a burguesia sempre beneficiaram os poderosos, os banqueiros e empresários. Qual o sentido de comprar parlamentares burgueses para votar em projetos de cunho e conteúdo burguês? Nenhuma lei de interesse dos trabalhadores foi votada e aprovada. A mais polêmica das votações foi a Reforma da Previdência que retirou direitos dos trabalhadores, em especial dos servidores.
Aquilo que ocorreu no dia 14 de maio de 2005, quando a imprensa divulgou um vídeo onde Maurício Marinho, então chefe do Decam/ECT, fazia suas tramoias com um falso empresário (o advogado Joel Santos Filho), teve como veículo principal que trazia a público a denúncia, nada mais nada menos que a reacionária revista Veja (envolvida agora no caso Cachoeira por meio de seu editor em Brasília). Quatro dias depois a mesma Veja estampava na sua capa: "O vídeo da corrupção em Brasília" e a principal matéria envolvia Roberto Jefferson, então presidente do PTB que, supostamente sob pressão, abriu o bico e denunciou que a base aliada do governo Lula recebia mensalmente recursos do PT em troca de seu apoio ao governo. O PTB e Jefferson eram aliados do governo Lula e do PT. Começava ali a monstruosa farsa.
O "mensalão" como parte da onda de criminalização dos movimentos sociais
Em maio de 2007, as fábricas ocupadas Cipla e Interfibra, na cidade de Joinville, sofreram uma intervenção violenta. Os membros da Comissão de Fábrica foram demitidos e hoje alguns deles, dirigentes eleitos pelos trabalhadores, estão sendo acusados de formação de quadrilha e outros absurdos. Estão juntos na acusação, os empresários, o Ministério Público e os Tribunais de Justiça. A revista Veja, a mesma que denunciou a existência do mensalão, foi o instrumento que publicou matéria acusando que se fazia treinamento de guerrilha na fábrica. Provas? Nenhuma. A Fábrica Ocupada Flaskô está sob a permanente ameaça de ser leiloada. Seus dirigentes ameaçados de prisão, bloqueio de contas bancárias, penhora de patrimônios pessoais etc.
O Ministério Público já demonstrou de sobra que odeia o MST. A revista Veja, a TV Globo, a imprensa burguesa em geral, trata os Sem Terra como vândalos, terroristas. Todos acusam os lutadores pela moradia de bagunceiros e aproveitadores. Vários sindicalistas, grevistas, estão sendo condenados e criminalizados.
Há de fato uma clara intenção de jogar a opinião pública contra os movimentos e o PT.
O ódio da justiça burguesa, dos procuradores, ministros, juízes, contra os trabalhadores não é de hoje. Protegeu os crimes da ditadura militar, condenou os movimentos, as greves, mandou prender vários sindicalistas e camponeses, lutadores pela reforma agrária. A Justiça protege os assassinos milionários, dá guarida e liberdade aos latifundiários que mandam assassinar trabalhadores rurais, aos que mandam matar sem terra e sem teto.
Mesmo os casos de corrupção, quando cometidos por sua gente, são encobertos e ficam impunes. É bom lembrar que Collor foi inocentado pelo mesmo STF e a Privataria Tucana, que virou best seller, foi ignorada pela grande mídia. Isso pra ficar em dois exemplos, pois a lista seria imensa.
A sanha contra o PT é tamanha que o procurador geral da República, Roberto Gurgel, mandou, pelo Ministério Público, fazer uma cartilha para ser usada nas escolas, explicando o que é o mensalão. Faz lembrar as cartilhas da TFP na época da ditadura que denunicavam os comunistas como comedores de criancinhas!
Em agosto de 2012, o STF começou o julgamento de 38 acusados de envolvimento em formação de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, gestão fraudulenta e evasão de divisas.
A imprensa dá um caráter épico para o acontecimento, fala de "julgamento do século" e de "maior caso de corrupção da história do País". Exageros que beiram o ridículo.
A base do PT, durante mais de sete anos, vem carregando consigo algo em que ela não teve a mínima participação nem tem responsabilidade. Se Lula esteve ou não para cair, se ocorreu ou não um sórdido complô contra o PT e Lula, a verdade é que jamais a direção do partido chamou a militância para a luta contra o monstruoso ataque ao qual foi submetido não só o PT, mas toda a massa de pessoas que votaram em Lula e depois em Dilma. Agora mesmo, a direção do partido continua a crer na boa índole dos ministros do Supremo Tribunal, deixando que os inimigos dos trabalhadores julguem os acusados, apelando para o bom senso e sentimento de justiça da reacionária instituição.
Durante mais de sete anos a imprensa burguesa bombardeou o partido, desmoralizando e jogando na prostração milhares de honestos combatentes.
Os órgãos da justiça, a começar pelo STF, mantiveram a espada sobre a cabeça de vários dirigentes e parlamentares do PT. Na verdade, a espada presa por um fio (o fio da colaboração de classes) está sobre a cabeça de milhares de lutadores que deram boa parte de suas vidas para a construção de um projeto socialista que nada tem a ver com a colaboração com a burguesia e seu modo de vida baseado na exploração dos trabalhadores, na propriedade privada dos grandes meios de produção e na mais hedionda forma de corrupção: a apropriação de toda riqueza produzida pelos trabalhadores!
A história ensinou a classe operária que ela não deve confiar na burguesia e em suas instituições
Os marxistas repudiam e não aceitam o Estado burguês e nem suas instituições. Lutamos para que os trabalhadores tenham a possibilidade de tomar o poder e eles mesmos construírem novas instituições. O PT deve ser a alavanca para esta luta, mas para isso deve romper a aliança de classes e fincar pé na construção de uma política independente, capaz inclusive de defender os dirigentes do partido contra os ataques da burguesia.
A base do partido deve defender o PT como seu instrumento de luta, deve adotar a luta de classes contra as reacionárias instituições do capital, contra a justiça do Estado burguês. Ou isso ou o partido será varrido do mapa junto com os dirigentes que permanecerem presos à política de conciliação e colaboração de classes. Os algozes dos dirigentes de hoje, amanhã serão os algozes de toda a base do partido e de todos aqueles que lutam pelo socialismo.
Estamos nas batalhas sindicais e nas lutas da juventude, estamos na batalha eleitoral apresentando nossos candidatos e nosso programa, não temos nenhuma ilusão nas instituições e no Estado Burguês, nossa construção segue sendo a peça chave para ajudar a classe operária a se desvencilhar do passado e se lançar na direção da luta pelo poder.
Nenhuma trégua aos burgueses e às suas instituições!
Em defesa do PT, contra a colaboração de classes e pelo socialismo: junte-se a nós!