quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Como o capital lucra com as catástrofes

O capital cria os desastres e, em vez de reconcer sua responsabilidade e mudar seu comportamento, procura lucrar também com eles. O caso mais emblemático é a exploração de petróleo no Ártico degelado.

Do The Guardian, via Outras Palavras.
O furacão Sandy e as escolhas da humanidade
Diante da mudança climática e seus desastres, restam duas opções: privatização radical, como nos EUA, ou multiplicar os bens comuns
Por Naomi Klein*, tradução Guilherme Bianchi
Menos de três dias depois de a tempestade Sandy chegar à terra firme na costa leste dos Estados Unidos, Iain Murray do Competitive Enterprise Institute culpou a resistência dos nova-iorquinos às mega-lojas como causa da miséria que eles estavam prestes a enfrentar. Escrevendo na Forbes.com[1], ele explicou que a recusa da cidade em adotar o Walmart provavelmente vai tornar a recuperação urbana muito mais difícil. "As pequenas lojas simplesmente não podem fazer o que podem as grandes lojas nessas circunstâncias", escreveu ele. Também alertou que, se o ritmo de reconstrução acabar por ser lento (como tantas vezes é), a culpa será das "leis sindicais como a Lei David-Bacon[2]", referindo-se à norma que exige que os trabalhos em projetos de obras públicos sejam baseados não no salário mínimo, mas no salário prevalecente na região.
No mesmo dia, Frank Rapoport, um advogado que representa construtoras bilionárias e vários empreiteiros imobiliários, escreveu sugerindo que muitos dos projetos públicos de obras não devem ser integralmente públicos. Em vez disso, sem dinheiro, os governos deveriam recorrer às parcerias público-privadas, conhecidas como "P3" nos Estados Unidos. Isso significa estradas, pontes e túneis sendo reconstruídos por empresas privadas, através das quais, por exemplo, poderiam construir pedágios e manter os lucros. Esses acordos não são autorizados em Nova York ou Nova Jersey, mas Rapoport acredita que isso pode mudar. "Em Nova York e Nova Jersey, algumas das pontes atingidas precisam de substituição estrutural, e isso será muito caro", disse ele. "O governo pode muito bem não ter o dinheiro para construí-las de maneira certa. E aí você se interessa por um P3."
O prêmio para o capitalismo de desastre mais vergonhoso, no entanto, certamente vai para o economista de direita Russel S. Sobel, que publicou no fórum online do New York Times. Ele sugeriu que, nas áreas mais atingidas, a Agência Federal de Gerenciamento de Emergência (Fema) deveria criar "zonas de livre comércio – em que todas as normas, licenciamentos e impostos estariam suspensos". Esta empresa "livre-para-tudo" poderia, aparentemente, "fornecer melhor os bens e serviços necessários às vítimas".
Sim, é isso mesmo: esta catástrofe, muito provavelmente criada pela mudança climática — uma crise nascida do fracasso colossal em criar regras capazes de evitar que corporações tratem a atmosfera como seu esgoto a céu aberto – é apenas uma oportunidade a mais para mais desregulamentações. E o fato de esta tempestade demonstrar que as pessoas pobres e a classe trabalhadora são muito mais vulneráveis à crise climática sugere a alguns que este é o momento certo para retirar, dessas pessoas, as poucas proteções trabalhistas que ainda lhes restam, bem como promover a privatização de parcos serviços públicos disponíveis para elas. E sobretudo, mesmo diante do fato de ser uma crise extraordinariamente cara e que nasceu da ganância corporativa, distribuir isenções fiscais para as corporações.
A íntegra.